A terceira proibição judicial do WhatsApp praticamente coincidiu com a decisão do governo interino de retirar a urgência constitucional do Projeto de Lei 5276/16, que trata da proteção de dados pessoais, conforme informou o líder do governo na Câmara, André Moura (PSC-SE).
O projeto – o último apresentado pelo Governo Dilma – trata da proteção de dados pessoais. O texto mantém algumas premissas básicas que já vinham alinhadas, como o uso dos dados somente com autorização e atrelado a finalidades específicas, além da criação uma autoridade nacional para regular e fiscalizar o tema.
A decisão do governo interino de retirar a prioridade começa a se explicar com o anúncio feito pelo ministro da Justiça do governo interino, Alexandre Moraes, que o governo estaria redigindo um Projeto de Lei para regulamentar o uso de aplicativos como o WhatsApp, para tentar encontrar um meio termo – com a liberação de dados pela OTT à Justiça, fato que a empresa do Facebook diz não ser possível fazer por conta da criptografia. Essa legislação poderá ser a base para proteção de dados pessoais na gestão Temer.
Encontrar um meio termo é de fato uma urgência para o Brasil, admite o coordenador do Centro de Tecnologia e Sociedade (CTS) da FGV Direito Rio, Daniel Vargas. “Se houvesse uma autoridade de dados, como se projetou no PL de Dados Pessoais, o cidadão teria seus direitos mais protegidos. O Estado tem os interesses dele. As empresas idem. O cidadão precisa ter quem o defenda”, salienta.
Vargas observa que é indesejável que um juiz com uma ‘canetada’ prejudique milhares de pessoas, mas é preciso também que o WhatsApp respeite a legislação do país onde está atuando. “A tecnologia pode transformar o impossível em possível. É preciso encontrar uma solução que não será a perfeita, mas esse não é um problema só no Brasil. O embate FBI x Apple já foi um capítulo relevante da questão da criptografia”.
Para o coordenador do CTS da FGV Direito Rio, o episódio WhatsApp revela que há um mundo novo impactando um mundo velho e há uma forte tensão entre os atores desses ‘mundos’. “Os dados são um tema sensível à nova economia. É preciso uma governança e, de novo, aqui desponta a necessidade de uma gente que regularia e atuaria para proteger essas informações”, completa.
Desproporcionalidade
Na visão do vice-presidente de Estratégias da Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico – camara-e. net, Leonardo Palhares, houve uma desproporcionalidade na aplicação da lei no caso da suspensão do WhatsApp. “Há outras maneiras legais de conseguir informações sem que milhões de pessoas que não estão envolvidas diretamente na prática do alegado crime sejam afetadas. Não se pode afetar milhares de pequenos negócios que usam o aplicativo”, afirma.
O criminalista Fernando Augusto Fernandes, sócio do Fernando Fernandes Advogados, por sua vez, sustenta que nenhum juiz tem o poder de impedir a comunicação de milhares de pessoas que não estão em sua jurisdição. Segundo ele, o máximo que essa autoridade poderia fazer era arbitrar multa financeira que pode ser revisada pelas instâncias judiciais.
“É mais um ato em que o Judiciário brasileiro expõe a insegurança jurídica nacional, que é hostil ao empresariado, ao mercado e aos direitos individuais. O FBI moveu todos os esforços para a Apple quebrar a criptografia do iPhone e não se viu o CEO da empresa ser preso por causa disso”, complementa Fernandes.
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